domingo, 23 de março de 2014

Escrava feia



Ainda ontem servia banquetes ao meu senhor e já hoje não passo de uma escrava feia.
Fiquei a morar com os cães. Mas em vez de dormir sonho com o Sol da minha aldeia.
Nesse tempo a montanha era branca. Essa côr fugiu para se esconder. Gostava de um dia arrancar os olhos ao meu Senhor para lhe espreitar os pensamentos. Seria preciso muita força pois tem olhos de ferro. As minhas mãos, paus fininhos. Talvez pensar seja coisa de escravo. Tal como viver é coisa de Senhor. Nesse caso seria como espreitar para um buraco sem fim. Lançar-me-ia nele para alcançar o outro lado do mundo.
O meu trabalho é escolher os grãos. O que não é fácil pois são como meus irmãos. Sinto-lhes a alma. Por isso deixei de comer. Cresce-me na barriga um mar de lágrimas. As que não posso chorar pelo meu amor.